A VISITA

A VISITA
Foto: Núbia Rodrigues

terça-feira, 13 de julho de 2010

CONTO - Sobre filmes e bolhas de sabão

Certa manhã acordou e seria Amelie Poulan. Se fosse ainda madrugada saberia contar um mundo em fotografias rasgadas e o compreenderia respeitando cada loucura. A loucura dos outros, não a sua.

Mas era manhã. E o mundo parecia de fato muito iluminado. Certo queimaria a lente dos óculos que o fotografariam. Deixou pra lá e levantou da cama.

Procurava uma espinha no nariz.

Solidão. Fez esquecer como é a voz humana. Gargantas tagarelas que a desculpassem.

Então ficava fitando o espelho. O enorme espelho que nem sabia como foi parar ali, e iluminava os olhos com uma lanterna para ver como é desenhado. Ou para observar o movimento contrátil e retrátil da retina. Isso era um prazer. Ao desligar a lanterna, a sombra que a luz criara continuava incomodando por minutos.

Também gostava de imaginar como seria morar em um formigueiro. A vida enfileirada lhe parecia interessante. Mas um buraco tão ínfimo, certamente não a comportaria. Preferia comer a torta que a tia deixara pronta em cima da mesa.

Era de amora? Não, de maçã. Mas ela gostava de pensar que era de amora, e que ao final, a língua ficaria roxa. Não ficava, mas até o final da torta ela já estava pensando em outras coisas. Sobre como os dentes morderiam se fossem feitos de chicletes, ou se as estátuas do jardim do parque central falavam. Certamente todos sairiam correndo, menos ela. Ficaria para falarem sobre coisas divertidas, como colar caquinha de nariz embaixo da mesa, ou tomar sorvete até dar dor de barriga.

Gostava mesmo é de colecionar palavras. Cada palavra nova que aprendia guardava numa caixinha que tinha dentro da cabeça. De algumas gostava tanto que usava quase todas as vezes que falava, mesmo quando falava sozinha. De outras, gostava tanto, que só repetia na mente, tinha medo que alguém a roubasse, palavras muito, muito bonitas.

À noite, ao se deitar. Não fechava os olhos, ou dormia como qualquer normal. Deixava-se levar por sons estranhos e flutuava numa bolha de sabão, até que a luz do sol a rompia, e ela caia outra vez na cama. Consciente.



Núbia Rodrigues

Rumo das Flores - Flávia Wenceslau


Belíssima canção da cantora nordestina Flávia Wenceslau. Com uma mensagem positiva sobre essa coisa árdua e esquisita que é o mundo. Para quem curte um som sereno e alto astral, é uma boa pedida.
Flávia também guarda em seu repertório outras muito criativas canções. Falando sempre de amor, fé e esperança, temas esquecidos do nosso cotidiano e que por vezes caímos na tolice de considerá-los piegas e ultrapassado. Não são e ainda bem que ainda há alguém que transmite mensagens assim.
Vale a pena ouvir.